domingo, 4 de janeiro de 2009

Há coisas que não se pode explicar. E o que Kazuo sentia ele realmente não sabia descrever.
Por que tinha que doer tanto? Se ele tivesse ido junto com os outros, será que isso tudo teria acontecido? Ele não sabia precisar. Tudo o que ele sabia é que doía, e que a dor era grande. Mas ele não podia continuar ali. Tinha que seguir adiante. Mas... mas ele não queria. O que fazer... o que fazer? Oh Deus, por que tinha que ser tão difícil? Tomou fôlego e se arrastou até uma árvore, coisa rara naquele lugar. Recostou-se a ela com dificuldade e suspirou profundamente. Um alívio temporário. Fixou seu olhar na paisagem a sua frente. Não era nem a sombra do que tinha sido. E ele via, no seu delírio, as crianças correndo, os homens e mulheres pra lá e pra cá, sempre com pressa, sem olhar para os lados, e os mais velhos, caminhando calmamente, sem a pressa dos mais jovens, sorrindo, conversando, saudando a todos.
O céu estava nublado. Iria chover. Uma lágrima escorreu pelo seu rosto. Formou-se uma gota em seu queixo. Pesou e caiu, tocando o chão. Caiu a chuva. O céu também chorava. Será que ele também sentia o que Kazuo sentia?
Sentiu o calor do sol tocar seu rosto. A chuva havia passado e, provavelmente, há muito tempo. Pelo jeito ele dormira a noite toda sem perceber. Será que havia desmaiado? O sol iluminava a paisagem. Os pássaros cantavam. Tudo parecia um pouco mais alegre, menos Kazuo. Ele não poderia estar alegre. De forma alguma. Jamais se alegraria sentindo o que sentia.
Tentou se erguer mais uma vez. Era um esforço e tanto no estado em que se encontrava. Depois de muito tentar, ergueu-se, agarrando-se à árvore junto da qual passara a noite. Estava com sede, precisava beber. Arrastou-se novamente com dificuldade até a fonte que por sorte se encontrava próxima dali. Alguns pássaros que ali se refrescavam esvoaçaram ao serem surprendidos pelo corpo do jovem despencando sobre a borda da fonte.
Mal conseguia reconhecer seu rosto no reflexo da água. Era apenas um rascunho do que tinha sido. Bebeu das mãos e enquanto bebia, acordou consigo: deveria ir embora dali. Mas não sem antes vê-la. Precisava vê-la, uma última vez.
Ergueu-se, com a ajuda de um pedaço de madeira que encontrou ali perto e com a ajuda do mesmo, foi deixando o local. Iria vê-la pela última vez, iria se despedir. Pensar nisso doía muito.
Depois de muito tempo, com muita dificuldade, Kazuo chegou ao local onde ela estava. O vento balança os seus cabelos, dificultando a sua visão. Lá estava ela, debaixo da árvore de cerejeira, que despejava suas folhas com o vento. A placa de madeira com seu nome indicava o local, agora coberto pelas folhas rosas da cerejeira.
Kazuo teve lembranças. Lembrou-se do seu olhar, dos seus cabelos ao vento, do seu sorriso tímido e breve. Caiu de joelhos e chorou. Suas lágrimas molharam o chão e as folhas que nele estavam. Ele não conseguiria ir embora dali. Ele jamais conseguiria deixá-la.
Agora ele sabia. Sabia porque doía tanto. Ele sempre soube. Não teve a chance de dizer o que sentia. Não pôde afagar seus cabelos, dizer palavras doces e sentir o sabor do seu beijo. E jamais o faria. Foi então que tomou a decisão: iria encontrá-la. Tomou a faca que trazia consigo junto ao cinto e empurrou-a contra o peito. O sangue saiu, e com ele toda a dor. Escorreu, tocou o chão, tingiu as rosas folhas de vermelho. O corpo, sem vida, tombou para o lado.
Há coisas que não se pode explicar, tampouco entender. O amor é uma delas.